Desde o berço do negócio há 50 anos, a Natura &Co está ligada à natureza, seus princípios, essências e matérias-primas. Assim, a companhia agora quer deixar cada vez mais clara outra simbiose em seu ecossistema de negócios: com a tecnologia e o todo universo digital. Nessa direção, anuncia hoje um investimento na Singu, a startup de serviços de beleza delivery criada por Tallis Gomes, o mesmo fundador da Easy Táxi. A companhia terá opção de assumir 100% do negócio no futuro.
Todavia, como é quase praxe nessas transações, o valor não foi revelado. Mais do que o montante aplicado, o que importa é o conceito: o reforço no papel da representante da marca e nos serviços para o cliente. A startup tem 3 mil profissionais de beleza cadastrados e a Natura vê potencial para centenas de milhares.
A base atual conta com 200 mil clientes ativos. Portanto, pela Singu é possível ter em casa desde manicure e pedicure, até serviços de depilação (incluindo masculina) e massagem, passando por cabelos. No Brasil, a estimativa é que o mercado de serviços de beleza movimente ao ano mais de 50bi de reais.
Natura &Co
A Natura &Co, que se tornou uma das maiores do planeta no setor de higiene e beleza após a compra da centenária Avon, vê o negócio como um canal importante para uso da marca pelas clientes — já que a rede prestará os serviços com os produtos da empresa — e também para transformar as profissionais em representantes da marca.
Contudo, a pandemia ensinou às consumidoras que a tarde de beleza no salão pode ser em casa, com as melhores amigas. Isto é, a Natura entende que essa compreensão é irreversível. Tudo hoje chega na mão do cliente. Não haveria motivo para ser diferente com a beleza.
É a aposta no modelo de social selling na veia. O conceito ganhou fama e status na pandemia. Aquela vendedora Natura que há 50 anos batia de porta em porta para mostrar as novidades agora é uma influencer, com o acesso aos clientes potencializado pelo mundo digital.
A Natura já enfrentou duros questionamentos sobre sua estrutura de vendas, calcada na representante da marca, o que contribuiu para que inaugurasse a versão do negócio em lojas franqueadas. Mas, na pandemia, a empresa assistiu esse modelo se transformar no que há de mais moderno em varejo. “O que era antiquado virou vanguarda”, fala, sem esconder o orgulho, João Paulo Ferreira, presidente da companhia para Brasil e América Latina.
2020
No ano de 2020, falar em varejo é falar em social selling. Até mesmo Via Varejo e Magazine Luiza viram a ferramenta como a solução para a crise: seja transformar o vendedor da loja física em um consultor online, seja pagar um representante externo com comissões para ajudar a turbinar as vendas.
Ainda assim, marcas de produtos de cama, mesa, banho, como Artex e MMartan, também aderiram à consultora, sem falar nas varejistas de moda que estão acelerando a versão digital de vendedoras. De acordo com Ferreira, em entrevista ao EXAME IN:
“Pretendemos mostrar que somos a Amazon, o Facebook e o Google do setor de higiene e beleza, tudo ao mesmo tempo.
Há cinco décadas atuamos como uma rede social. Só que durante muito tempo isso teve de ser feito de forma offline, pois o mundo digital ainda não existia. Mas criamos essa marca contando nossa história e de nossos produtos por meio de nossas consultoras, que hoje são 4,6 milhões [quando considerada a força de vendas Avon]. Sabemos fazer isso melhor que qualquer um, pois sempre fizemos. E isso vai ficar cada vez mais claro.”
Triunfo
A companhia ganhou as manchetes nas últimas semanas com a campanha de Dia dos Pais que contou com vários influenciadores, inclusive o ator transgênero Thammy Miranda e seu filho Bento. Ou seja, associado ao debate, a Natura viu as ações terem forte alta na bolsa, o valor de mercado da companhia ultrapassou a marca histórica de 60bi de reais.
Embora a ação promocional tenha virado hit, o que conduz os negócios na bolsa mesmo é uma grande expectativa pelo balanço da companhia do segundo trimestre. Os números serão conhecidos após o fechamento do pregão de quinta-feira, dia 13. Os investidores estão ansiosos para ver o que a digitalização e o social selling fizeram pelas vendas no período. De janeiro a março, a receita líquida do grupo todo somou 7,52 bilhões de reais, com alta de 1,9%
No 1º trimestre, as vendas onlines já tinham crescido 250% — sendo que as marcas Natura e Avon tiveram alta de 150%. A The Body Shop teve incremento de 300% e a marca premium de origem australiana Aesop registrou aumento de 500%. Entre os analistas que acompanham a empresa, há uma grande aposta de que a Natura &Co vai ampliar os detalhes e dados a respeito da operação digital no segundo trimestre.
Laboratório de Cosméticos e de Tecnologia
Agenor Leão, vice-presidente de negócios digitais, dita que:
“Quando a pandemia começou, a Natura &Co repriorizou todas as iniciativas e projetos de tecnologia que vinham sendo desenvolvidos.
Enquanto muita gente punha o pé no freio nos investimentos, a gente acelerou.”
Do mesmo modo, a empresa fechou dois contratos para fortalecer o universo tecnológico: com a ThoughtWorks e com a Salesforce. Em meio à pandemia, a Natura captou 2bi de reais por meio de um aumento de capital privado — sendo que 500 milhões de reais sairam do bolso dos fundadores.
Com o primeiro, o time de engenharia para desenvolvimento duplicou de 150 para 300. E com o segundo, a empresa trabalha para desenvolver ainda mais as ferramentas para as vendedoras, com tecnologia digital aplicada ao CRM — sigla em inglês para gestão do relacionamento com cliente. Há hoje mais de 25 squads funcionando na empresa e todos com um viés tecnológico. Os grupos multidisciplinares estão até mesmo nos de criação de produtos.
2º Tri
No 2º trimestre, quase 9% dos pedidos Natura vieram das encomendas online diretas por clientes, seja no aplicativo da companhia, seja no e-commerce das vendedoras, contou Leaõ ao EXAME IN. Todavia, é a primeira vez que a Natura &Co mede e revela esse dado. A diferença ainda está nas encomendas feitas pelas consultoras, que compram os produtos para revender.
A companhia terminou o primeiro trimestre com 700 mil lojas virtuais de suas consultoras. Três meses depois, esse total saltou para 1,1 milhão. Dentro do grupo, a operação da marca Natura — que abriga 1,6 milhão de consultoras da marca no Brasil e América Latina — é a mais avançada no modelo digital.
Deste modo, para auxiliar nesses canais, bem como, transformar a vendedora em uma influenciadora, a empresa passou a fornecer durante a pandemia uma série de conteúdo pré-preparados, organizados na forma de uma espécie de catálogo chamado “Minha divulgação”.
Esse material pode ser prontamente usado da forma que está ou ainda editado e personalizado conforme cada vendedora, ao gosto do freguês. As ferramentas de social selling passaram a ser fornecidas no fim de 2019, mas foi durante a pandemia que a quantidade de facilidades se multiplicou. E a adoção delas também.
A consumidora Natura pode até testar maquiagem de forma virtual. Isto é, entre as ferramentas disponíveis, está um “espelho” em que a cliente pode aplicar sombras, batons e toda sorte de produtos para ver como fica.
As Ferramentas
O percentual de vendedoras que usa as ferramentas dobrou durante a pandemia e já representa 40% da base. Aquelas que usam com grande intensidade já são quase 25% do total e com adesão crescente. Dentro do canal das consultoras, a cliente hoje já pode finalizar sua própria encomenda ou apenas sinalizar suas escolhas.
As encomendas das revendedoras hoje já são todas feitas de forma eletrônica. E metade é realizada por meio do app Natura. “Nossa aposta em mobilidade se mostrou muito acertada”, disse Luciano Abrantes, diretor de inovação digital da Natura. A companhia adotou o aplicativo para as consultoras no fim de 2015 e criou a versão para os consumidores um ano depois.
Pandemia vs Companhia
Cida Franco, diretora de vendas e relacionamento, contou que a pandemia também ajudou a companhia a aprender a usar os canais digitais para aglutinar, potencializar e preparar as vendedoras. Até então, os encontros pessoais, as reuniões regionais com a equipe interna de vendas eram o principal canal de preparação da rede de consultoras para os ciclos de produtos. Mas tudo teve de mudar com a pandemia e Cida se viu, de repente, falando em uma transmissão ao vivo para 300 mil vendedoras ao mesmo tempo, o equivalente a mais de quatro Maracanãs lotados de uma vez. Algo absolutamente impensável e impossível no mundo físico.
“Nada disso foi inventado na pandemia. Apenas revisamos as prioridades. Tudo isso já existia dentro da companhia”, conta Abrantes. “Nossa jornada com a tecnologia começou em 2014”, explica, ao lembrar o lançamento do site de vendas online. “Levamos quatro anos para fazer com que mais de 90% da base fizesse as encomendas pelo canal digital. Agora, a curva de adoção das ferramentas de social selling será muito mais rápida. Porque as vendedoras já estão dentro do canal. Hoje, eu não tenho uma loja online, tenho mais de 1 milhão, com o e-commerce de cada uma das revendedoras.”
Apostando nas Vendedoras
Questionada por que a Natura segue apostando na vendedora e não apenas em canais digitais de venda no modelo autosserviço digital, Cida sequer pensa duas vezes. “Com a consultora, eu falo da marca, dos nossos valores. Elas impactam muito mais. As consultoras são praticamente nossa razão de ser.”
O grande desafio que a companhia vai enfrentar é levar o modelo digital para a Avon, que começou a ser integrada ao negócio no começo deste ano. A pandemia acelerou o processo de união das operações, mas ainda não há comparação entre o estágio tecnológico da gigante de origem americana e o da Natura.
Voz: A Próxima Fronteira
Mobilidade foi a principal aposta da Natura de tecnologia nos últimos cinco anos. A próxima fronteira agora será nos serviços de voz, conta Abrantes. O executivo disse que alguns testes estão sendo realizados com a Amazon, com o app de meditação. Mas, segundo ele, isso é um aperitivo. A companhia entende que as assistentes virtuais terão grande papel no futuro e prepara algo grande nessa direção para os próximos meses.
“Estamos atentos a todo universo de startup, mas também faremos parcerias com as gigantes do setor quando necessário”, afirma Abrantes. A companhia tem mapeado hoje um universo de mais de 4.000 startups e já usa o serviço de mais de 30.
PIX
Nas ferramentas para as revendedoras, a Natura também já estuda o que o PIX, a promessa de revolução no sistema de pagamentos, poderá fazer para facilitar a vida de todos que usam o ecossistema da companhia.
O grupo entende que a digitalização não foi apenas o seguro durante a pandemia, mas é a ferramenta que vai potencializar o acesso dos clientes à marca, diretamente e por meio das revendedoras — que agora atuam como influenciadoras. O número de clientes atendido pelas plataformas mais modernas da empresa se multiplicou por três durante a quarentena e o total de acesso à revista de produtos passou de dez milhões no fim do segundo trimestre.
Fonte: Exame.
O Direito não pode ficar de fora
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